Espírito Democrático

Resolvi criar esse espaço para poder divulgar minha opinião como representante sindical aqui no Comando Nacional de Greve da Fasubra Sindical - 2011. Aproveitando o acesso mundial da rede de computadores que facilitará e democratizará à informação detalharei cada passo meu, cada trabalho do CNG e disponibilizarei todas as novidades em primeira mão para os trabalhadores da Universidade Federal do Acre.

quarta-feira, 17 de julho de 2013

QUANDO NOSSOS OLHOS NÃO DEIXAM PASSAR "EM BRANCO"


No final de semana que passou (dias 12, 13 e 14/jun) aconteceu o V Rio Branco Fashion Week, o evento de moda da capital acreana, que na oportunidade as modelos acreanas divulgaram os produtos das lojas da cidade. Foi meu primeiro evento do gênero em Rio Branco, confesso que gostei muito se não fosse um detalhe do primeiro dia, diga-se de passagem, um grande e grave “detalhe” que faz toda a diferença no resultado do evento.
Iniciando a apresentação das meninas e meninos que naquela noite eram as “estrelas” do evento, imediatamente eu contei treze meninas e cinco meninos perfilados num palco, a rigor todas magérrimas e os homens naquele estilo “malhadão”. Esse não é o “detalhe” que me referi no parágrafo anterior. O fato que mais me chamou a atenção foi ao perceber, imediatamente com um olhar clínico, que das treze garotas apenas uma menina era negra, as outras doze meninas eram o modelo europeu de beleza, loiras de olhos azuis. E dos cinco garotos nenhum negro, índio então nem se fala, nem nas meninas e nem nos meninos havia um sequer com traços indígenas, apesar de o evento ser realizado numa cidade onde várias índias (os) residem.
Com essa observação já fiquei me coçando todo na cadeira, inconformado ao extremo com aquele racismo “velado” que os meus olhos denunciavam, queria imediatamente sair dali e falar com a organização do evento, mas me contive e assisti o evento até o final. Para algumas pessoas essa minha avaliação pode ser um tanto extrema, um tanto fora da realidade, desnecessária, um grande exagero. Até porque há quem diga que “somos todos iguais, independente se é preto, amarelo, branco ou índio”. A pergunta que não quer calar é a seguinte: será mesmo que nas relações sociais somos tratados nessa igualdade? Muitas pesquisas afirmam que NÃO.
O fato é que ao final fui falar com o organizador do evento, me dirigi até o rapaz, me apresentei, o parabenizei pelo o evento e fiz uma simples pergunta: Por que das treze meninas desfilando só tinha uma negra e dos meninos nenhum negro, no acre não tem modelos negras (os) e índias (os)? Na verdade não é uma simples pergunta, até porque na resposta ele me faz uma pergunta: O senhor está achando que isso é racismo? Eu não afirmei nada (até porque se faço isso escancaradamente eu estaria acusando-o de um crime, cabendo ao acusador, no caso eu, provar o crime, como sabemos, não é nada fácil provar um crime racial no Brasil) apenas fiz uma simples pergunta e disse mais, seu evento está belíssimo, porém não está representando todas as belezas acreanas que temos, pois não temos nenhuma índia (o) e só temos uma mulher negra e nenhum homem negro, como pode observar seu evento não demonstra para o público as diversas belezas que temos num país tão multicultural e afrodescendente como o nosso.
E o rapaz insistia em dizer que o desejo dele era exatamente valorizar a beleza negra e por isso havia colocado a única negra para desfilar em todos os momentos, pois particularmente ele achava a beleza negra magnifica. Fui embora após essas e outras desculpas esfarrapadas que não minoraram o racismo gritante, pode ter sido até não intencional, isso não importa, mas estava ali estampado para todas as pessoas constatarem, mas é claro, nem todas estão vendo esses detalhes, o quanto as pessoas reproduzem a imposição do padrão “perfeito” de beleza, qual seja, o europeu, o único e belo padrão a ser seguido. E os cabelos negros encaracolados, as tranças e o rastafári? Que se danem o padrão de beleza é cabelo loiro e liso. Descontruir essa imposição social realizada pela a indústria de beleza e a grande mídia é uma tarefa diária do militante que deseja e luta por um mundo mais igual, sem preconceito e discriminação.
Eu não sei se meus poucos minutos conversando com o organizador do evento surtiu algum efeito, o fato é que no outro dia ao chegar para assistir o desfile, meus olhos foram surpreendidos logo na primeira apresentação com um equilíbrio de raças entre as (os) modelos. Já tinha a modelo com traços indígenas, homens negros, e a cada dupla de garotas que entravam no palco para desfilar uma era branca e a outra era negra, ou em alguns casos como vi, as duas eram negras, e assim se viu um equilíbrio na cor das modelos. Diga-se de passagem, que vários eram os comentários de elogios da plateia em relação à diversidade étnica racial presente nas (os) modelos, tanto nos intervalos como na saída do evento.  
Não sei se a conversa do dia anterior interferiu nessa diversidade apresentada no segundo dia de evento, mas o fato é que não aguento me calar diante de tamanha discriminação proporcionada pelo racismo velado que diariamente afeta as relações sociais e aumenta ainda mais o fosso entre negros e não negros, excluindo-os de usufruir direitos elementares da cidadania. Subjugando uma raça em detrimento da outra. Uma juventude negra que diariamente é vítima da bala perdida; é vítima do cassetete da PM; é a maior parte da população presente no sistema carcerário; é excluída do acesso às políticas públicas de inclusão social; acumula a maior taxa de desemprego e a maioria vive em condições sub-humanas nas periferias das cidades, longe de possuir uma educação de qualidade capaz de formar um cidadão que promova o desenvolvimento do país.  Logo, não me calarei enquanto vida tiver, e não medirei esforços no sentido de minorar o fosso social existente em nosso país, combatendo arduamente o racismo “nosso de cada dia”.


Charles Brasil, Trabalhador em Educação da Universidade Federal do Acre (UFAC); vice-presidente do Conselho Municipal de Promoção da Igualdade Racial de Rio Branco.   

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